
Eis uma experiência pelo qual todos passamos.
Lá pelos seus quinze anos, você fez sua primeira visita a uma loja de discos com seu melhor amigo (ou primo, ou irmão mais velho). Claro, você já conhecia rock e metal pelos discos que pegava emprestado dele ou que ouvia na MTV, mas entrar numa loja de discos era uma experiência nova pra você.
E não falo de lojas de discos de Shopping Center, limpinhas, com ar condicionado e moças uniformizadas que só escutam Inimigos da HP e que falam errado o nome de metade das bandas que você gosta.
Não senhor, me refiro a aquelas lojas que parecem um porão, cheias de miniaturas de Senhor dos Anéis em uma prateleira atrás do balcão, discos de metal tocando a todo volume e um cara todo tatuado e com higiene questionável para atender a clientela.
Tenho certeza que você se lembrou de um local muito específico agora.
Pois bem, lá está você, com seus quinze anos, grana que ganhou do aniversário e prestes a comprar o primeiro disco que é só seu. Após uma looooonga escolha, finalmente você se decide, leva sua compra para casa e escuta o disco até memorizar absolutamente TODAS as letras de todas as canções contidas nele.
E aí já era, você foi fisgado. Vai passar um bom tempo de sua vida comprando discos das mais variadas bandas, vai passar a usar camisetas de bandas, vai tentar aprender a tocar algum instrumento com variantes graus de sucesso e pode ser que deixe o cabelo crescer e forme sua própria banda.
Pois é.
E por que diabos estou fazendo este discurso nostálgico no review de um game?
Simples, porque Brutal Legend evoca todas as sensações desta época tão saudosa e divertida que foi parte de todas as nossas vidas.
METAAAAAAAAAL!!!

Brutal Legend conta a história de Eddie Riggs, o Roadie supremo.
Para quem não sabe, “Roadies” são os caras que fazem todo o trabalho de bastidores das bandas. Eles carregam instrumentos, arrumam o som para as apresentações, dirigem o ônibus da banda e ficam aos fundos no palco, atentos a cada detalhe e preparados para agir caso a necessidade apareça.
No início da história, Eddie se mostra bastante decepcionado com o atual estado da música, onde moleques idiotas misturam Rap com Metal, fazem um lixo sonoro que dói e não mostram conhecimento tampouco respeito para com as bandas de metal gloriosas do passado.
Uma coisa com o qual todos podemos simpatizar, basta sintonizar na MTV e ver as bandas horrendas que a molecada de hoje curte.
Enfim, durante um show de sua banda, Eddie sofre um acidente e seu sangue cai sobre a fivela de seu cinto. Um monstro cria vida no palco, elimina a banda de emo-metal-rap (algo que traz um sorriso ao rosto) e Eddie é transportado para um mundo onde absolutamente tudo é inspirado na cultura do metal.
Lá ele descobre que é o herói que ajudará a resistência a derrotar o perverso General Lyonwhite e seu mestre, o monstruoso Doviculus. Para esta missão, Eddie conta não apenas com a ajuda dos irmãos Lars e Lita Halford, mas também de Ophelia, o curandeiro Kill Master (ninguém menos que Lemmy Kilmster do Motorhead), os Fire Barons (cujo líder é dublado por Rob Halford, do Judas Priest) e do Guardião do Metal, magistralmente representado pelo Príncipe das Trevas, Ozzy Osbourne.
O mundo de Brutal Legend é uma fantasia de Rock em seus mínimos detalhes. Cada estrutura, território e cenário parecem ter sido extraídos diretamente da capa de um disco de metal das décadas de 1970 e 1980.
Os personagens também são tremendamente carismáticos, Eddie é o típico cara grandão e meio assustador, mas que é muito gente boa e um amigão leal, enquanto Ophelia é a encarnação da garota roqueira por quem todos nos apaixonamos em algum momento da vida. Com sua maquiagem pesada, camiseta preta de banda de metal e jeans surrado, se os produtores queriam criar uma heroína adorável e sexy sem ser gratuita, acertaram na mosca com ela.
Não que faltem decotes ousados e mulheres semi nuas, estamos falando de um mundo onde o Metal é a lei e todas as garotas que sejam parte de tal universo por lei são gostosas e seguras de si o suficiente para exibirem suas curvas.
O enredo de Brutal Legend se mostra simples inicialmente e qualquer jogador razoavelmente experiente pode acreditar que até a metade do game já terá desvendado o desenrolar de toda a história. Pois bem, o roteiro é bem escrito e traz algumas reviravoltas difíceis de prever, mesmo que você já esteja acostumado as eternas surpresas de MGS e ache que nada mais pode te pegar de calças curtas, Brutal Legend tem pelo menos duas cenas que o farão ficar surpreso e estupefato.
Algo cada vez mais raro hoje em dia.

A parte visual é muito boa e possui uma direção de arte diferente da maioria dos jogos atuais. Nada é ultra realista e tanto os personagens quanto cenários possuem uma representação que mescla um estilo de Cartoon com a arte inspirada pela cultura do metal.
Os personagens são bastante expressivos, com traços exagerados, olhos grandes e proporções físicas nem sempre realistas. Algumas pessoas podem torcer o nariz para este estilo visual, mas é uma lufada de ar fresco no gênero de ação, que hoje em dia parece obcecado com a Unreal Engine e sua capacidade de deixar o visual “realista.”
Os cenários são bem construídos e parecem ter saído da capa dupla de um vinil de Heavy Metal. Conforme se atravessa os continentes, as locações mudam drasticamente de planícies para cavernas, depressões sombrias e finalmente um local que parece o coração do planeta, com a cor do sangue por todos os lados.
Como não poderia deixar de ser, o áudio do game é um de seus pontos fortes.
A dublagem é fantástica, pura e simplesmente. Jack Black está simplesmente perfeito como Eddie Riggs e consegue passar ao personagem doses muito equilibradas de “bom mocismo” e agressividade, Eddie é um cara legal, mas não é alguém com quem você queira mexer.
Os astros da música que emprestam suas vozes ao jogo também fazem um trabalho excepcional. Rob Halford interpreta dois personagens (o General Lyonwhite e o líder dos Fire Barons) e faz com que tenham vozes e personalidades muito distintas, Lemmy Kilmster é simplesmente ele mesmo ao dublar o Kill Master e Ozzy Osbourne parece ter tido a maior diversão de sua vida ao interpretar o Guardião do Metal.
Inclusive, tanto Ozzy quanto Jack Black improvisaram um bocado as falas de seus personagens e acrescentaram uma tonelada de palavrões nos diálogos (uau, que surpresa). Isso colocou muita naturalidade a interpretação dos dois e tornou seus personagens ainda mais críveis.
O resto do elenco traz também Tim Curry no papel de Doviculus, o ator veterano torna o vilão incrivelmente odioso e assustador, o que é a marca de um bom tirano do mal. Os demais personagens também são muito bem interpretados, o que demonstra que o elenco de dubladores que não eram astros do Rock não pretendiam ficar atrás de Ozzy e Cia.
E se equiparar a lendas da música não é uma tarefa fácil, vou te dizer.
A trilha sonora é o que se pode esperar de um game com esta temática: METAL! Com direito a Kiss, Motorhead, Black Sabbath, Motley Crue, Judas Priest, Lita Ford, King Diamond, Savatage, Accept, Ratt, Slayer, Athrax e muito mais.
Se você for tão fã de Metal quanto eu, deve estar salivando neste momento.

A jogabilidade de Brutal Legend é uma grande mistura de gêneros e embora não se destaque grandiosamente em nenhum deles, consegue fazer um serviço com qualidade bastante uniforme na maior parte do tempo.
Primeiramente, este é um game de ação. Eddie possui um bom arsenal de combos e ataques especiais com os quais pode enfrentar os inimigos, além de diversos solos de guitarra que podem ser encontrados ao redor do mundo e que servem as mais diversas funções, desde aumentar o poder de combate de seus companheiros até derreter a cara de seus inimigos.
Sim, aqui você pode derreter a cara dos inimigos! Faça melhor, Miyamoto!
O mundo de Brutal Legend é aberto, como o de GTA, Saints Row e diversos outros games do gênero. Se avança na história viajando até certos pontos e conversando com personagens específicos, que então lhe designarão missões.
As missões podem variar desde simples combates em estágios lineares, etapas de corrida onde é preciso proteger o ônibus de turnê do grupo contra atacantes ou batalhas estratégicas em tempo real.
As batalhas estratégicas são o terceiro tipo distinto de jogabilidade presente aqui. Nestes momentos, você guia Eddie através de um campo de batalha e tem que produzir tropas dos mais diferentes tipos de soldados a seu comando (Headbangers, Amazonas, Curandeiros, Etc) e determinar o que devem fazer.
As tropas são criadas usando a energia dos fãs. A energia dos fãs é dispensada no ar através de Geisers e é preciso tocar um solo de guitarra específico perante estas fontes para que os fãs comecem a ser direcionados para seus aliados e possam ser usados.
Grande parte das batalhas consiste de canalizar os fãs para o seu grupo e impedir que os inimigos possam fazer o mesmo. Logicamente, a escolha de tropas adequadas é muito importante, assim como descobrir o objetivo da vitória (destruir uma fortificação inimiga ou simplesmente sobreviver a uma batalha por tempo o suficiente).
Inicialmente demora um pouco pra se pegar o jeito de tais conflitos, mas conforme o jogo avança, fica bem mais fácil gerenciar suas tropas, decidir quais as melhores para cada situação e como controlá-las em batalha.
O mundo do jogo é bastante vasto, mas não é preciso desbravar a pé, logo no início da história, Eddie descola o “Deuce” que será seu leal veículo de transporte por todo o game. É possível comprar vários Upgrades para o carro na “loja” do Guardião do Metal, desde armas como metralhadoras e lança mísseis até blindagens para melhor atropelar as criaturas em seu caminho.
Você também pode comprar novos combos, novos tipos de guitarras e várias outras coisas, mas para isso é preciso ter Fire Tributes, que são a moeda corrente deste mundo e podem ser adquiridos toda vez que se completar uma missão secundária.
Estas missões estão espalhadas pelo mapa e englobam desde emboscadas a forças inimigas, até corridas contra um monstro com péssima dentição e sotaque Irlandês. A história principal de Brutal Legend é um pouco curta (pouco mais de oito horas de jogo), mas completando todas as missões secundárias, o jogo se torna muito mais robusto.

Brutal Legend não é um game perfeito.
A tentativa de Tim Schaeffer (que também criou Psychonauts, você devia jogar) de mesclar diversos tipos de jogabilidade funcionou bem, mas pode ser muito mais refinada no futuro.
Mesmo assim, o puro espírito musical, o bom humor sempre presente, dublagem estelar e a fantástica trilha sonora tornam Brutal Legend mais do que um simples game e fazem dele uma declaração de amor a toda uma cultura que anda de mãos dadas com o mundo dos games.
GO FUCKING CRAZYYYYYYYYY!!!
Cheers!!!