terça-feira, 1 de outubro de 2019

Crítica do Amer: Rambo - Até o Fim


Quero começar esta crítica questionando a sabedoria de se lançar um quinto filme do Rambo.

Digo, Rambo IV: Fanfarras na Birmânia foi um fechamento perfeito pra saga do herói. A cena final, com o soldado caminhando em direção à velha casa de sua família e finalmente deixando a guerra para trás, foi a forma perfeita de se encerrar a jornada do ex-boina verde.

Mas não... Stallone queria brincar de Comando em Ação mais uma vez... E Deus o abençoe por isso.

Dito isso, Rambo: Até o Fim é uma merda gloriosa e todos vocês deviam assistir.


Nosso filme começa exatos 11 anos após Rambo IV. John Rambo (Arnold Schwarzenegger) agora vive na fazenda de sua família e tenta passar o crepúsculo de seus dias de forma calma, cuidando de cavalos, sentado em sua cadeira de balanço e construindo túneis no terreno de sua propriedade, como os vietcongues faziam, enquanto se entope de remédio para transtorno de estresse pós-traumático, como todo homem de 72 anos.

Os dias de nosso veterano são alegrados por Gabrielle (Yvette Monreal), sua sobrinha adotiva. Uma menina tão adorável e inocente que provavelmente nunca ouviu a palavra “pipi”. De fato, se lesse a palavra “pipi” em livro, ela o arremessaria longe, se esconderia debaixo da cama abraçada a sua Twilight Sparkle de pelúcia, e só sairia após o tio Rambo confirmar que não havia nenhum “pipi” escondido no armário tentando pegar ela de surpresa.

O que, considerando que eles moram numa fazenda no meio do nada, é algo que ele deveria checar com frequência.

Enfim, essa vida calma vai pro vinagre quando Gabrielle decide ir ao México encontrar seu pai, um lanfranhudo que abandonou ela e sua mãe quando a menina ainda tinha idade para ser coadjuvante da novela Carrossel. Rambo e sua avó... A avó de Gabrielle, não de Rambo... PELO AMOR DE DEUS, RAMBO TEM 72 ANOS! COMO A AVÓ DELE AINDA ESTARIA VIVA?? VOCÊ COMEU COCÔ? PERDEU A NOÇÃO DA REALIDADE? TÁ PENSANDO QUE ISSO AQUI É PREACHER???

Enfim, Rambo e a avó de Gabrielle (Adrianna Barraza) a alertam contra essa ideia, mas vocês sabem como são os jovens: Eles só fazem merda. A menina vai pro México, confirma que seu pai é fezes batidas no liquidificador e decide ir pra uma balada pra tentar esquecer sua decepção.

Vejam.

Uma menina tão ingênua que faz a Cinderella parecer uma pilantra da sinuca de boteco do Brás... Vai pra uma balada, ambiente que reúne os maiores dentre os lazarentos... No México... Um país tomado por cartéis criminosos que estão numa eterna queda de braço com o Estado islâmico pra ver quem consegue ser mais filho da puta... Claro que todos esses fatores somados dão um resultado muito pouco positivo para a doce moçoila.

Alguns dias após o sumiço da menina, Rambo vai pro México disposto a reaver a sobrinha. É quando ele descobre que ela foi sequestrada por um cartel controlado pelos Irmãos Martinez (Sergio Peris-Mencheta e Óscar Jaenada), e é nesse momento que você como espectador, teme pela integridade do México, pois sabe que o herói vai estripar o país inteiro para salvar sua pimpolha se precisar.

Neste exato momento, estou pensando no Chaves se escondendo no barril, quando uma mão musculosa e calejada surge das trevas, o puxa pelo chapéu, coloca um facão em seu pescoço e mostra a foto de uma loli enquanto pergunta: “Donde está?”

Chaves merece. Ele fez blackface.


Falando com toda sinceridade, Rambo: Até o Fim é bem fraquinho. A película tem muitos problemas.

Eu disse “PROBLEMAS”, não que o filme é “PROBLEMÁTICO”! Vocês tão pensando que tão falando com quem? Com um pescoço de lápis de cabelo verde que é imprestável demais para ler um livro sobre ciência política e que portanto politiza entretenimento na esperança de ganhar palminhas de seus amigos igualmente inúteis e desprovidos de higiene? É ISSO QUE VOCÊS PENSAM DE MIM???

Mas sendo justo agora, a maioria das críticas sobre o filme na mídia nacional foram negativas, mas não politizadas. Pelo menos, não vi muitos críticos tupiniquins fazerem uso de termos caça-cliques como “masculinidade tóxica”, algo que foi muito mais presente em artigos internacionais. No Brasil, tivemos a boa e velha arrogância do crítico de cinema esnobe, que detona filmes que sejam de maior apelo popular, enquanto eleva filmes de arte peidorrenta que ninguém vai assistir. Nenhum problema em se gostar de filmes de arte, mas sim, em acreditar que isso faz de você um ser superior aos demais, apenas por preferir um tipo diferente de entretenimento.

Devido a essa arrogância, as críticas foram no mínimo amadoras, dignas de uma página pessoal de Facebook e não de veículos de circulação nacional. Rambo: Até o Fim tem diversos problemas que foram prontamente ignorados pelos críticos brasileiros, que preferiram fazer críticas óbvias e juvenis a violência do filme e até mesmo a aparência de Stallone (“ain, ele está velho e com o rosto deformado por plásticas”).

O filme tem graves problemas de estrutura, ignora aspectos que se tornaram parte vital da natureza da saga e possui um final que, ao menos em minha percepção, é extremamente insatisfatório, mas estes aspectos foram totalmente ignorados, em prol de se atacar os músculos venosos do protagonista.

Não, sério. Um crítico se deu ao trabalho de atacar o fato de que Stallone é um velho musculoso.

Então, aqui fica um apelo a meus colegas jornalistas que trabalham com crítica de cinema: Sejam mais profissionais. Hoje existem milhares de pessoas na internet fazendo o mesmo trabalho que vocês, só que com muito mais paixão, integridade e classe, e oferecendo informação real para o público. O jornalista cultural está se tornando obsoleto numa velocidade alarmante, e a menos que mude seu Modus Operandi, será extinto em menos de uma geração.

Pronto, fim do discurso. Voltemos ao Rambo e seus problemas.


Mas antes dos problemas, falemos do elenco, que faz um excelente trabalho neste filme.

Confesso que quando vi as primeiras imagens de Rambo com cabelo curto, fiquei com um pé atrás. Sempre associei o soldado a cabelo comprido, seu novo penteado o fazia parecer uma versão militar do Balboa, e fiquei preocupado que os dois personagens se tornassem indistinguíveis.

Bom, queimei a língua, pois havia esquecido que Stallone é um excelente ator, e antes que você comece a rir de tal afirmação, lembre-se que o velho Sílvio foi indicado aos Oscars de melhor ator e melhor ator coadjuvante (Por Rocky - Um Lutador e Creed, respectivamente), ganhou um Globo de Ouro de melhor ator coadjuvante (por Creed) o Critic’s Choice também como ator coadjuvante (novamente por Creed) e mais uma renca de indicações e prêmios por seu trabalho. Então sim, Stallone é ótimo em sua função, mas eternamente desprezado por ser um parrudo, pois vivemos em um mundo que acha que todo musculoso (ou gostosa) tem baixo quociente intelectual, quando o fato de Sly ser um sucesso e ter conseguido manter seu nome em evidência por mais de 40 anos em uma indústria predatória que devora, caga e esquece suas estrelas diariamente, é uma enorme prova contra tal afirmação.

Mas estou divagando.

O cabelo curto faz com que Rambo se pareça com um Balboa que deu errado. Enquanto o Garanhão Italiano é um bonachão, o cara que pode te dizimar com um soco mas que prefere te dar um abraço, enfim, o sujeito que todos queríamos ter como melhor amigo, Rambo é... Enervante. Mesmo em seus momentos mais pacatos, o personagem parece estar constantemente lutando para evitar que algo muito ruim seja liberto. O cabelo comprido sempre simbolizou a selvageria do personagem, como a juba de um leão, sempre pronto a avançar contra a sociedade que teimava em tentar domesticá-lo. Seu novo penteado não é apenas uma escolha estética, mas a forma do veterano tentar se adequar a civilização, bem como as pilhas de remédios que ele toma para manter seu TEPT sob controle.

Isso faz com que os momentos onde bandidos tentam intimidar o herói gerem uma ansiedade deliciosa na plateia. Já conhecemos Rambo de outros carnavais, e não há como afastar a sensação de que os vilões estão fazendo bullying em um dragão ao longo da história.

Dito isso, os vilões são repelentes. Se Rambo é o Balboa do universo espelhado, os irmãos Martinez são galãs de Betty, a Feia e Maria del Bairro que vieram do inferno. Sergio Peris-Mencheta e Óscar Jaenada não são vilões gourmetizados como o Thanos, eles são apenas canalhas lazarentos que cometem atrocidades pois isso lhes rende dinheiro, exatamente como criminosos da vida real. O trabalho dos dois era fazer com que o público quisesse vê-los transformados em sarapatel, e eles desempenham esta função de forma magistral.

Para finalizar, não posso esquecer de Yvette Monreal, intérprete da trágica Gabrielle. Como eu disse anteriormente, ela transpira inocência, o que cria um contraste interessante com Rambo. De um lado, temos essa menina ingênua, otimista, com a vida inteira pela frente e que espera somente o melhor das pessoas. Do outro, temos um velho duro, machucado, que viu o pior que o mundo tem a oferecer. A relação dos dois é convincente porque a menina é como um farol na escuridão da alma do soldado, algo capaz de acalmar a besta interior que o fez vagar pelo mundo atrás de novos conflitos após deixar o Vietnã. No fim, é a ingenuidade de Gabrielle que a coloca em risco e força a besta a mais uma vez tomar o controle do herói, que mesmo na velhice, não tem o direito de estar em paz.

O elemento humano do filme é muito bem construído. Infelizmente, o resto da produção não recebe o mesmo cuidado.


Então, qual a treta aqui?

Vejam, filmes de ação precisam seguir uma estrutura básica, alternando momentos de intensidade com cenas de calmaria. Tomemos O Exterminador do Futuro 2 como exemplo. O filme começa com o T-800 (Jean Claude Van-Damme) chegando ao presente, entrando em um bar de motoqueiros e descendo a porrada em todo mundo pra descolar algumas roupas e uma motoca, em seguida somos apresentados a John Connor (Edward Furlong), o quanto ele é um babaquinha de 12 anos que gasta seu tempo no fliperama e descobrimos o que aconteceu com Sarah Connor (Linda Hamilton). Todas estas cenas são lentas e servem para estabelecer o mundo da história. Após este período de calmaria, o T-800 e o T-1000 (Patrick Stewart... NÃO, Robert Patrick) encontram John no shopping, temos um tiroteio seguido de um caminhão perseguindo uma moto em um canal pluvial da cidade.

Entendem meu ponto? Um filme de ação tem de ser uma parábola que sobe e desce, alternando entre a calma e o frenesi. Se tivermos apenas ação, o filme se torna um amontoado de ruído branco (como acontece com todos os filmes dos Transformers), mas excesso de calma torna o filme um grande bocejo.

Todos os filmes anteriores da franquia Rambo seguiram a fórmula clássica estabelecida por outros títulos do gênero. Rambo: Até o Fim, imprudentemente, foge a esta regra e gera resultados decepcionantes.


O filme concentra toda a ação em seus quinze minutos finais, quando os bandidos invadem a fazenda de Rambo e são trucidados com armadilhas ao estilo Esqueceram de Mim, só que mais letais.

Bom, com resultados visuais realistas pelo menos. Digo, quando uma lata de tinta cheia e em velocidade terminal é arremessada contra o rosto de alguém, acho que resultaria em morte, ou ao menos dano cerebral permanente. Na vida real, Macaulay Chocookie teria terminado os anos 1990 na FEBEM com dois homicídios nas costas.

Aliás, não reclame de spoilers. Os trailers claramente mostraram um comboio de vilões invadindo a propriedade do Rambo. Não seja fresco comigo agora.

Ma bene, o filme se arrasta até chegar à gloriosa cena final, de fato, é como se 75 minutos de sua duração fossem um mero prólogo para a batalha em seu terceiro ato. Não apenas isso, a história perde tempo com momentos desnecessários, como o momento em que o herói passa dias desacordado após ser atacado pelos membros do cartel que está perseguindo. Claro, a ideia da cena era transmitir a vulnerabilidade do herói e passar uma sensação de urgência, com Rambo desacordado enquanto sua sobrinha estava nas mãos dos criminosos, mas este último se torna supérfluo quando o longa já havia mostrado a menina sendo forçada a trabalhar em um prostíbulo, e a vulnerabilidade de Rambo... Bom, o cinema passou quase quatro décadas estabelecendo que o sujeito é um monstro invencível, de fato, este é o motivo pelo qual seu público prestigia seus filmes. Meio tarde para tentarem mostrá-lo como um velhinho fragilizado, não? Especialmente quando seu intérprete tem 73 anos e está em melhor forma que 90% dos homens ocidentais.

A história ainda tem momentos sensacionais, como a cena em que Rambo interroga uma chola escrota e corta a marra da menina com seu charme de quem tinha um colar de orelhas no Vietnã, mas o filme tem um escopo bem menos épico que os demais filmes da franquia. Enquanto cada aventura anterior do soldado parecia um momento chave em sua vida, este aqui parece apenas sua terça-feira.


Rambo: Até o Fim é o filme mais fraco da série. Numa escala em que Rambo: Programado para Matar é o pináculo da franquia, e onde Rambo III é seu ponto mais baixo, me atrevo a colocar este ao lado do terceiro longa da saga.

A melhor maneira de se ver este filme é fazendo de conta que ainda estamos em 1985. Junte um grupo de amigos que cresceu com filmes do Stallone, coloque todos em um Passat, regue a viagem até o cinema com hits de Lionel Ritchie, A Flock of Seagulls e Cindy Lauper, e balance seus Mullets vigorosamente sempre que Rambo cometer uma selvageria na tela.

Mas o mais importante: Deixe as expectativas em casa.

Este não é o diamante mais brilhante que o senhor Stallone já poliu, mas ainda é bonito de olhar.

Cheers!!!

10 comentários:

Cassiotkg disse...

Que bom, essa critica é o Amerindo na sua melhor forma.
Rambo pode não ser tão satisfatório, mas ver que o Amer ainda tem o dom da escrita é refrescante.
Continue com as criticas!!!

Éder disse...

Boa tarde e bem vindo de volta ao blog , Amer . Bom , não posso falar nada sobre o rambo pois minhas lembranças mais recentes do personagem vem da série animada a qual não assisto desde 2008 . Bom isso é tudo e parabéns pelo retorno ao blog e continue com seu ótimo trabalho .

Gabriel Meireles disse...

Esse aí me parece um grande exemplo de de "Prazer Culpado". Filme pra ser diversão escapista kkkkkk
Acho que o primeiro será sempre o melhor (e mais sólido) de todos.
Achei interessante aquele segmento a respeito da repercussão que o filme tem tido na crítica especializada. Sinceramente, eu não tive contato com essas avaliações que chamam o filme de problemático pelo personagem principal ou por não ser "artístico" o bastante.
Eu honestamente não entendo por que as pessoas gostam de criar esse maniqueísmo entre filmes mais convencionais "blockbuster" e filmes menos convencionais "cult". Como se não fosse possível uma pessoa apreciar ao mesmo tempo "2001: uma Odisseia no Espaço" e "Vingadores:Ultimato". Como se a pessoa fosse "arrogante, prepotente e elitista" por gostar de um, ou "ignorante, inculto e grosseiro" por gostar do outro.
No fim das contas, sempre defendo que podemos gostar tanto do mais convencional quanto do menos convencional. Não é necessário criar essa "rivalidade". Da mesma forma, é sempre possível ter um olhar crítico em relação a aspectos presentes no cinema e nos filmes do passado e atuais, mas sempre tentando ser razoável e bem informado.

Enfim, gostei bastante da avaliação, Amer! Um grande abraço!

Leandro"ODST Belmont Kingsglaive" Alves the devil summoner disse...

Bela crítica Amerlância.

Já tenho um Crush nessa Yvette Monreal, e verei esse filme quando puder.

E sim, nunca vou esquecer no dia onde Stallone perdeu o Oscar de ator coadjuvante por um tiozinho irrelevante onde fez "Ponte de Espiões ". Se fosse disputar com o Tom Hanks, eu entenderia o Rambo perder a estatueta, mas para Mark Rylance???

Desde esse dia e entre outros motivos, já desconfiava que o Oscar é uma papagaiada sem tamanho.

Bier disse...

Graças a você, agora eu vou querer ver o filme.
Você é um crítico sensato. E de graça.
Um abraço! E continue o bom trabalho!

disse...

"O jornalista cultural esta se tornando obsoleto". Este Amer, um eterno otimista

Laura Oliveira disse...

E pensar que tudo aconteceu por que Gabrielle era impressionantemente burra. Por que ela passou da ingenuidade pra burrice, com certeza.

Luã disse...

Amer-san, você PRECISA fazer uma crítica do filme do Coringa!

Jonas Santos disse...

Mandou super bem na crítica, Amer. Não pretendo assistir o filme agora, mas a análise me fez querer assisti-lo futuramente num dia de ócio qualquer.
É muito bom ver alguém criticar algo por seus defeitos e não por esse algo não se adequar a sua visão de mundo (cof... cof... Ign.com)

Jonas Santos disse...

Simmmmm.